21.11.10



Equilíbrio

Tênue e ainda vital,
A linha que define
Complexidades de alma;

Dos gêneros librados,
O eu mais improvável;

Como olhar o espelho
E vê-lo refletido nos
Seus olhos novamente;

Minhas olheiras denigrem
Um escasso brilho:
Porém olhos e espelho
Refletem-se ao incontável;

É o consistir em vontade:
Talvez de vida e morte,
Ou então bem e mal;
Busca-se o que ser aqui;

Trago dois destinos
E deixo um terceiro
Guardado no silencio;

Logo tudo envelhecerá,
Pessoas e estátuas,
Como às ruas do centro...

Em um dos destinos
Que é para o invisível;

13.11.10



Andarilho

Não sei do meu tempo;
Conheço apenas horizontes,
Infinitos e inalcançáveis;

Intrínseca é essa gana,
De algumas léguas de mundo
E toda a poeira nas botas
É só o efeito dos rastros;

Pois o que carrego na mochila
É o caminho de volta pra casa;

Quem sabe a retórica do vento,
Para os tantos vagões europeus;

Onde olhares são metódicos,
Porem os beijos incoerentes;

Bebi cerveja com bárbaros,
Nas estradas rumo ao norte;
Fiz discursos aos lordes,
Com um quê de enólogo;

Sobre a sina dos viajantes?
Sentir e deixar saudades;
Aprender a guardar pra si,
Os seus silêncios de espera;

Vejo o nascer e o por do sol,
Sempre na mesma direção;

27.9.10




Quase Pecado

Ah! Esse nosso
Cinismo desleixado:
Um tom de escárnio
E outro de enfado;

Lagrimas verdadeiras
Para o choro falso;
Às pessoas passam:
Os dogmas acabam;

Será esta ânsia vã?
Meus bons momentos
Levam o teu jeito;

Bobagens escritas,
Nas linhas do teto;

Sagazes e libertinos,
Dia e noite revezan-se
Através das frestas;

Somos meros anjos,
Ociosos e decadentes;

Ah! Essa nossa
Excentricidade sã:
Um tom de indiferença
E outro de soberba;

1.9.10




Cinema Mudo

É assim que os domingos
Deixam de se arrastar;
Falam-me de artifícios
Nas imagens que vejo;

Quem entende o feitiço,
No mistério que chega?
Ao lado da novidade,
É quase uma emulação;

Uma pequena cidade,
Pra ser alma e grandeza;
Outra época qualquer,
Ainda em preto e branco,

Vemos girarem às fotos,
Para os segundos eternos;

Protagonistas perdidos
Entre às cenas mudas;
Não somos bons atores;

Meu olhar precisa salvar
O que não foi ensaiado;

Quando sou um senhor,
Com chapéu e bengala,
Meio velho desconfiado
Sem o deslumbre pueril;

Vieram novos cartazes
E alguns dos teus sorrisos;

É assim que de súbito:
Impulsiona-se a vida
E inspiram-se cidadezinhas,
No coração dos poetas;

25.6.10



Música Ao Sol Nascente

Entre o céu e o abismo,
Está o nosso frágil lar;
Ponderação será plenitude?

Não leve por edênico
O jardim que lhe dei:
Lá, sempre haverá anjos
Desejando perder às asas;

Persuada-me com olhares;
Mostre-me algo à ser digno;

Ás vezes, pareço acreditar
Nessas minhas figurações;

E então, minha apoteose;
Estátuas cobertas de pátina?
Tens a quintessência como
Parte desse meu devaneio;

Lembro quando o “pra sempre”
Tornou-se pouco confiável;

Tenho canções ao arrebol
E alguns livros na estante
Para poder brincar de Deus;

13.5.10




Sobre Todas Às Coisas

Traz um pouco de muito
O nosso excêntrico saber;
Conversaremos por mil anos?

Ainda é cedo para mudar
Os teus olhos de agora;
Ontem aprendi sozinho
Este porvir improvável;

Procuro café e silêncio,
Enquanto deixo para depois;

Incompreensível filosofia:
Já enlouqueci uma vez;
Não gastei meus calçados;
Deixei os dedos na parede;

Por vezes, torna-se impérvia,
A cômoda serenidade indecisa;

Hoje encontro-me em casa,
Meus caros, bons e velhos;
Sem profanar o ordinário
Vinho, dos sagrados dias;

Vejo o além sem panorama;
Pretensioso é o meu empireo;

23.4.10



Epopéia De Marduk

Mito de si mesmo,
O ser antes do tempo;
Poemas e desertos na
Lua em quarto crescente;

O que contarão de você
Nas lendas que ouvirei?

Já não sei para quem
Escrevo minhas quiméras;

Mostre-me o insano
No absurdo esquecido;
Reveja tua crença provável;

Criamos com zelo;
Destruímos com ira;

Os filhos dos deuses
Serão nossos herdeiros;

Antecessoras de Homero,
Às tábuas hoje perdidas;
Danças ao fogo e vento,
Sem às primeiras razões;

6.4.10



O Arauto

Ofereça-me o que beber,
Em nome do que for;
Não há notícias de paz
Para os nossos filhos;

Posso improvisar sofismas;
Posso não voltar para casa;

Mas no que você acredita,
Mulher entre os faraós?
-À astúcia que mostra-me
Ignora devidas proporções-

Tenho feitos e tragédias
E sei como descrevê-las;

Irreversível, inevitável
O nosso coração pétreo;
Alguém observa o vilarejo
De homens despedaçados;

Um movimento temerário
Desprovido de confiança?
Diga para este mecenas
Não estender-me a mão;

Ainda posso esperar o vento
Capaz de levar este rumor;

13.3.10



Para Depois De Amanhã

Não avise-me deste
Nosso lúgubre outono;
Já foi determinado
O período de ascensão;

Deram-me às fábulas:
E compreendo as cigarras;

E todo este empenho
Em tempo desperdiçado
-No dia em que nasceu
Um momento operário-

A honesta simplicidade,
Será apenas honrável
Em sua senilidade;

Não incomode-se comigo;
Não fale-me de pecados
Enquanto sinto desprezo;

Por mais que seja preciso...

Nós esperamos demais
Da mesma primavera;

6.3.10



Panacéia

Nestes livros sagrados,
Oriente e ocidente
Pareceram-me iguais;
Meu bom amigo;

Vejo dor na esperança
E as cãs dessa história;

Suposições e manuscritos:
Cinzas da erudição
Perdida em Alexandria;

Sobre suas lágrimas
De unicórnio?
Nem ao menos à perfeita
Formula;

Poderia ser verdade;
Você mereceria tê-la;

Mas ainda lavo minhas
Mãos, antes de ver
O sangue escorrer;
Precisamos respirar;

Às vezes foge-me uma
Parte da humanidade;

É esse o nosso jeito;
E essa a nossa culpa;

26.2.10



A Catedral

Guarda ruas de pedra
Minha senhora Chartres,
A magnífica sombra
De dual sentimento;

Vitrais translúcidos,
Ilusórios mosaicos
E espíritos influídos;
A fé na escuridão;

Um semblante medievo,
Imponente, gótico,
Dourado régio portal,
Digno de reverência;

Tornei-me do rei à efígie,
Na prelazia enfraquecida,
Um olhar fidalgo entre
Carvalho, ecos e bronze;

Talvez cavaleiro, cruzado
Da ordem perdida em
Justas e belas cortesãs;

Mas tu ficaste no tempo,
Real, lendária, perpetua;

18.2.10



Uma Canção Perdida

Uma incorreção definida
Por palavra incomum,
Veio-me então criancice
Para o lugar do sábio
E esquecido traquejo;

O retrato sobre à mesa,
Um sorriso coberto de pó;
Noites de versos silentes
Sem àquela que é lira;

Vejo às pessoas pela rua;
Fim de tarde repetido,
Esperando o merecido choro;

Perdão por meia culpa?
Meu desejo e aflição;
Um gosto de fel que
Amarga junto ao orgulho;

O som da chuva calma,
Cadência de certas manhãs;

Sublime amor deste lado?
Vicissitudes da existência;

Novamente não me enganei,
Mas disse não me importar;
Ela já esteve desprotegida
Antes de haver um começo;

26.1.10



Um Lamento

Enfim contemplaremos
Tua secular obra;
Senhor que nos envelhece;

-Nossos vícios por ambição
Abandonada– E a virtude
Consumindo-se aos poucos;
Meu vagaroso pesar;

O que fazem os anjos
Quando Deus não está
Em casa?

Já nos faltam palavras
Em tempos de lamentações;
Salvo quem move às peças,
Somos um pulmão sem fôlego;

Sátiras cansadas desse negro
Humor dos profetas;

Temerosa sabedoria ao
Escrever o último livro;

Tomei a sina dos menestréis
Por seu espírito regresso;
Sinto não existir alguém que
Possa ao menos chegar tarde;

21.1.10



A Ilha

Mares desconhecidos
Em corações errantes;
Navego num veleiro
Batizado de Ethica Mores;

De águas profundas
Para algum lugar
Além da alma;
E o que somos realmente?

Trinta e dois ventos
Porfiam por nossa direção;
Quem não vislumbrou
A sombra do leviatã?

Tempestades fascinam
Ousados comandantes,
Mas enseadas merecem
Noites selênicas;

Eis o fanal que ilumina
Poucos homens;

Um pedaço de terra
Designando o complexo ser,
E o poente não é mais
Inalcançável;

São asas de albatroz
Escondidas sob as pálpebras;

20.1.10



Encruzilhada

Refletidas ou impetuosas,
Escolhas definem à sorte,
E as verdades sobre um
Homem de outrora;

De súbito far-se-ia liberto
O subjetivo das palavras;
- Uma recente aflição
Presa na garganta covarde –

Sobre deixar toda esperança...

Apenas quatro diretrizes
Como ensejo de resignação;
Talvez três anjos e um
Demônio por natureza humana;

O que será das mãos idôneas,
Quando os termos forem ignorados?

O fim que espreita à sombra dos anos,
Encontra primeiro os simplórios;

Irá um justo sangrar no inferno,
Quando tantos sangram no lugar
Onde estamos?

Pois ninguém cruzou os dolorosos
Círculos de renomados habitantes,
Em Malebolge se escondem os olhos
Negros da glória;